quinta-feira, 25 de dezembro de 2025

Temporada de Montanha: Ep1

Todo ano é a mesma coisa! Quando vai se aproximando o Natal eu e alguns de meus guias botamos tudo no carro e partimos para os Andes. Os meses de verão, quando no Brasil é temporada baixa no montanhismo, na Argentina e Chile é a melhor época e ali estão alguns dos maiores gigantes de nosso continente, como o Aconcágua e Ojos del Salado, montanhas que guiamos todos os anos para nossos clientes na Soul Outdoor, minha empresa de expedições em montanhas junto com Maria Tereza Ulbrich, minha sócia e esposa.

A temporada deste ano se inicia de maneira singular, com um novo desafio: a primeira expedição ao Cerro El Plomo. Esta montanha chilena, próxima à capital e de grande valor histórico, é notável não só por suas paisagens impressionantes, mas também pelo achado de uma múmia inca em estado de conservação impecável, descoberto em 1954 no seu cume.

Assim, neste episódio inaugural, detalho a aventura da jornada até lá: uma viagem de quase 3 mil quilômetros, cruzando o sul do Brasil, a Argentina e o Chile.

Frio na barriga na despedida

Minha vida está estabelecida em Curitiba há 18 anos, onde se concentram minhas empresas, meu círculo de amigos, a família da minha esposa e o “Preto”, meu cachorro, que, curiosamente, se chama “Veneno”, o nome que minha mãe deu e que contradiz totalmente sua natureza dócil.

O desafio de deixar tudo para trás no calor do início do verão e correr contra o tempo para organizar as expedições é uma constante. Optamos por levar todo o equipamento em nossa caminhonete 4×4, preparada para longas jornadas, em vez de contratar serviços terceirizados de uma empresa local. Embora essa escolha signifique mais trabalho, ela nos permite uma gestão financeira potencialmente melhor. É este o caminho que seguimos.

Neste ano, a jornada começou ao lado de Wellington Miranda, carinhosamente conhecido como “Well”, um montanhista de 33 anos que faz parte da equipe de guias da Soul, com quem trabalho o ano inteiro. Confesso que, mesmo após quase duas décadas viajando de carro para o Chile e Argentina, a cada partida sinto aquele frio na barriga, na despedida e diante da incerteza dos caminhos que nos levam aos Andes.

Não é que a estrada seja perigosa, mas as dificuldades burocráticas e os imprevistos sempre surgem, pequenos detalhes que me custaram alguns fios de cabelo ao longo dos anos. Afinal, nessas idas e vindas, além de carro quebrado, já fui vítima de roubos, tanto por parte de ladrões quanto, lamentavelmente, da própria polícia. Por isso, a cautela e o cuidado redobrados são sempre necessários.

Nossa jornada começou cruzando Paraná e Santa Catarina, terminando em Ibirubá, no noroeste gaúcho. Lá, reencontramos Jovani Blume, um grande amigo que, além de tocar uma auto elétrica, foi essencial em expedições épicas nos Andes. Há dez anos, Jovani foi peça-chave na primeira ascensão de um vulcão de 5.845 metros, a montanha sem nome mais alta e inescalada dos Andes. Batizamos o pico de “Parofes”, em tributo ao montanhista Paulo Roberto Felipe Schmidt, falecido um ano antes em decorrência de leucemia. Essa é uma história que, por si só, merece ser contada em um filme.

Em Ibirubá, encontrei Lana, companheira de Jovani, e aproveitei para melhorar o sistema de iluminação da minha caminhonete, que estava precário. Perdemos meio dia com o serviço, mas valeu a pena. Depois de atravessar a fronteira em Uruguaiana naquele mesmo dia, dirigimos quase a noite toda graças aos novos faróis, parando apenas para descansar em Saturnino Laspiur, uma pequena cidade no interior de Córdoba.

Após só duas horas de descanso, seguimos para Mendoza. Lá, pudemos reorganizar nossa carga: deixamos em um depósito parte das coisas que vieram do Brasil e pegamos outras que estavam guardadas, essenciais para a viagem ao Chile. Comemos umas empanadas, dormimos e, no dia seguinte, continuamos pela Ruta 7, subindo a Cordilheira dos Andes.

O dia estava incrivelmente bonito, e a paisagem montanhosa, coberta por muita neve, estava espetacular. Fizemos nossa primeira parada para uma refeição decente em Uspallata, onde saboreamos um bife de Chorizo, um prato que é a cara da Argentina.

No entanto, a conta nos trouxe um susto: um almoço para duas pessoas — uma carne por pessoa, uma salada compartilhada e uma água de 1 litro — custou 62 dólares! Há apenas dois anos, o máximo que essa conta daria seria 30 dólares. A Argentina de Milei ficou cara, e isso acabou afastando meus clientes. Por essa razão, nesta temporada, a maior parte do meu trabalho será concentrada no Chile. Mas é claro que vou narrar aqui a escalada do Aconcagua que farei em janeiro!

A viagem ocorreu sem grandes percalços, exceto na aduana. O problema foi a descoberta de um morcego que atropelei (sem notar!) preso ao radiador. A fiscalização já estava lenta, com filas enormes para os trâmites, e os oficiais decidiram intensificar a inspeção. Tive que esvaziar a caminhonete, passar tudo pelo scanner e depois guardar tudo de novo! Para piorar a situação, a autorização de cartório que fiz no Brasil para o Well dirigir não é válida no Chile. Serei obrigado a perder tempo em Santiago para refazer a documentação

A jornada de quase 3 mil quilômetros levou 4 dias. Em Santiago, nos instalamos em um hostel no bairro de Providencia, uma área de classe média alta da capital. O quarto, de aproximadamente 10 metros quadrados, está repleto de caixas e malas de equipamentos, mas pelo menos estamos praticamente sozinhos aqui. Nos próximos dias, faremos a organização de tudo e as compras necessárias. No entanto, essas tarefas ficarão para depois do Natal. Por enquanto, a prioridade é descansar e planejar, incluindo a elaboração do cardápio da expedição e o refinamento do planejamento geral.

E vocês poderão acompanhar meus relatos dessa longa temporada de montanha que se estenderá até abril!

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