sexta-feira, 6 de junho de 2025

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O aeroporto onde a pista afunda e ursos espreitam na neve

No extremo norte do planeta, onde a luz do dia pode durar meses ou desaparecer por completo, existe um lugar que desafia as leis da engenharia, da natureza — e da sobrevivência. Mas o que parecia uma façanha da civilização agora se torna um aviso silencioso. O que acontece quando o chão simplesmente começa a desaparecer sob seus pés?

A resposta pode estar na gelada Longyearbyen, principal cidade do arquipélago de Svalbard, na Noruega, onde o aeroporto mais setentrional do mundo trava uma luta diária contra o próprio solo que o sustenta. Mas engana-se quem pensa que esse desafio técnico é o único risco por lá. Urso polar à espreita, blackout logístico e uma corrida silenciosa contra o colapso climático transformaram o local em um microcosmo das tensões globais.

Enquanto voos comerciais da SAS e Norwegian ainda pousam em meio à vastidão branca do Ártico, um perigo invisível corrói a base dessa operação vital. E o que está em jogo vai muito além do asfalto rachado: é o futuro de uma ilha, de uma cultura e talvez de um dos últimos paraísos selvagens da Terra.

O aeroporto que afunda: o gelo derrete sob as turbinas

Construído sobre o que um dia parecia ser um chão eterno de gelo, o Aeroporto de Svalbard está agora afundando lentamente. Isso porque sua pista de 2.300 metros repousa sobre permafrost — solo permanentemente congelado que, com o aumento das temperaturas globais, está deixando de ser… permanente.

Durante os meses de verão, o monitoramento precisa ser diário. Pequenos colapsos podem abrir rachaduras perigosas, interromper operações e colocar vidas em risco. “É uma corrida contra o tempo e contra a natureza”, diz Ragnhild Kommisrud, gerente do aeroporto, que já teve de solicitar um cargueiro militar com geradores após o colapso da usina elétrica local.

Mas, ainda assim, o aeroporto continua sendo o fio de vida da ilha. Com cerca de 2.500 habitantes, Svalbard depende dessa conexão aérea para abastecimento, emergência médica e, claro, turismo. Sem pista, não há plano B rápido: os navios podem levar até dois dias em cada trajeto.
O carvão cede lugar ao turismo — mas com ressalvas

Durante décadas, Svalbard sobreviveu graças à mineração de carvão. Agora, com o fechamento de minas como Sveagruva e a substituição da usina a carvão por uma movida a diesel — ainda com pegada ecológica preocupante —, a ilha busca uma nova fonte de renda: o turismo.

Ouro branco

Mas esse novo “ouro branco” também exige equilíbrio. O número de quartos em toda a ilha foi limitado a 500 para conter o impacto ambiental. Empresas locais alertam os visitantes sobre os riscos: não sair da cidade sem guia, carregar rifle contra ursos e não contar com sinal de celular fora das áreas urbanizadas.

E mesmo esse turismo é restrito pelas estações. No inverno, há escuridão total por quatro meses. No verão, o sol não se põe. Isso atrai aventureiros, mas pode enganar os despreparados. A menor falha de planejamento pode ser fatal.

A nova corrida do Ártico — entre gelo, gás e geopolítica
Enquanto os turistas chegam com câmeras em punho, o mundo também volta seus olhos para o norte por razões mais estratégicas. Com o derretimento das calotas, novas rotas marítimas se abrem, e países como Rússia, China e Estados Unidos demonstram crescente interesse nas riquezas do Ártico.

Svalbard, embora pacífica, está no epicentro dessa disputa silenciosa. O Tratado de 1920 dá à Noruega soberania, mas permite que outros países explorem economicamente o arquipélago. A Rússia ainda mantém uma operação de mineração em Barentsburg. A China investe em pesquisas. E os Estados Unidos, atentos, observam de longe.

O que antes era isolamento agora é geopolítica. E o aeroporto — vulnerável, mas indispensável — tornou-se uma peça-chave nesse tabuleiro congelado.

No fim das contas, o que ainda sustenta Svalbard?

Pode parecer que tudo em Svalbard está à beira do colapso: solo que afunda, clima que oscila violentamente, predadores à espreita. Mas o arquipélago resiste. Uma nova usina movida a biogás está prestes a ser inaugurada. Painéis solares funcionam a todo vapor durante o verão. E, mais importante, há um senso coletivo de urgência — e de preservação.

A ilha onde ursos circulam ao lado de cientistas, turistas e operadores de drone talvez seja um dos últimos lugares verdadeiramente selvagens da Terra. Mas também é um lembrete de que, mesmo nos cantos mais remotos do planeta, as escolhas humanas e o impacto climático já chegaram.

E talvez seja esse o maior alerta: se até o gelo eterno está derretendo, o que mais estamos prestes a perder?

turismo.ig.com.br

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