segunda-feira, 14 de julho de 2025

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Leilão de áreas protegidas em Paraty (RJ) gera disputa judicial

Em abril, um leilão público  vendeu 32 áreas em Paraty, no sul do Rio de Janeiro, incluindo 63 ilhas, encostas do Mamanguá, praias e parte do Parque da Serra da Bocaina,  áreas protegidas e ocupadas por comunidades tradicionais. As informações são do Fantástico.A disputa judicial que se seguiu colocou em risco a tranquilidade do município, reconhecido como Patrimônio Mundial pela Unesco, gerando temor entre moradores e mobilizando órgãos públicos que agora pedem a anulação da venda.

O Saco do Mamanguá, uma rara formação de mar entre montanhas com oito quilômetros de extensão, é um dos locais afetados. Além de abrigar um importante manguezal, o Mamanguá é considerado um dos berçários marinhos da região.

A tensão provocada pelo leilão atingiu diretamente os moradores. “ O estado emocional da população está completamente abalado ”, relatou Gilcimar Corrêa, presidente da associação de moradores local ao Fantástico. “ Tem gente que não consegue dormir direito .”

As terras vendidas pertenciam ao comerciante português José Maria Rollas, que adquiriu os lotes em 1936 em um leilão da Receita Estadual, com a intenção de mantê-los como patrimônio familiar, sem ocupação ou exploração.

Segundo o chefe do ICMBio Paraty, Anderson Nascimento, muitas dessas áreas estão sob ” regime especial de proteção “, o que impõe regras e limitações de uso.

Conflito entre documentos e presença de moradores

Os novos proprietários teriam se baseado apenas nas descrições dos anúncios do leilão, que destacavam a beleza natural das áreas, mas não mencionavam a presença de famílias tradicionais, como pescadores e trabalhadores do turismo de base.

Eles compraram um papel, né. Tem gente aqui ”, afirmou Eder Costa, morador da Ilha do Araújo ao Fantástico. “ É uma angústia que é quase uma doença .”

Muitas dessas famílias vivem há mais de 200 anos nas ilhas. Cleonice dos Santos, da Ilha do Cedro, afirma que sua comunidade está no local há sete gerações. Já Neli Costa dos Santos, do Mamanguá, apresentou um documento de 1912 que comprova o pagamento de impostos pelos antepassados.

Parte dos terrenos leiloados abriga hoje uma escola pública e duas igrejas, além de estar localizada dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) Cairuçu, criada em 1983 para preservar tanto o meio ambiente quanto a cultura caiçara.

Órgãos públicos pedem anulação do leilão

A advogada Thatiana Lourival, do Fórum de Comunidades Tradicionais, questiona se os compradores sabiam das implicações legais e sociais. Ela observa que os valores pagos foram baixos em comparação à extensão das áreas.

Um dos arrematantes da Ilha do Cedro pagou cerca de R$ 437 mil e já desistiu do negócio, alegando que não sabia da ocupação tradicional no local.

Apesar das restrições ambientais e da ausência de autorização judicial para a posse, moradores relatam abordagens de alguns compradores. O advogado Gustavo Kloh, doutor em Direito Civil, alerta: “ Quem comprou pode ter feito um mau negócio ”, em entrevista ao Fantástico.

Ainda assim, advogados de parte dos compradores afirmam ter seguido a lei e estariam abertos ao diálogo, desde que seus direitos também sejam considerados.

O caso mobilizou o Ministério Público Federal, a Advocacia Geral da União e a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, que pediram a anulação do leilão.

A polêmica se refletiu em protestos durante o Festival de Jazz da cidade, com o grito coletivo de “ Paraty é terra caiçara! ”. Há também o receio de que o município perca o título de Patrimônio Mundial.

Segundo Marcela Cananeia, do Fórum de Comunidades Tradicionais, a Unesco reconheceu Paraty com base na “ troca do povo tradicional, da cultura viva com o meio ambiente ”.

O advogado das herdeiras dos terrenos, Nizzo de Moura, defende a validade do leilão e afirma que uma eventual anulação será objeto de recurso. Para ele, o que pode ocorrer é “ a necessidade de uma conciliação de direitos ”.

Já Gustavo Kloh reforça que a preservação das áreas tem valor coletivo: “ A descaracterização dessas áreas é uma perda para todos nós ”.

turismo.ig.com.br

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