Há anos as companhias aéreas brasileiras vêm encontrando maneiras de transformar em serviço pago tudo aquilo que antes já estava incluído no preço da passagem. É um processo gradual, mas constante. A cada nova tarifa, um benefício antigo deixa de ser cortesia e passa a ser cobrado à parte, fazendo com que o passageiro, muitas vezes sem perceber, acabe pagando mais para receber menos.
Funciona mais ou menos como aquele streaming em que a gente paga a mensalidade, mas precisa desembolsar à parte se quiser assistir a um filme recém-lançado, ou então é obrigado a ver propaganda mesmo sendo assinante. A lógica é a mesma: serviços que antes estavam incluídos no pacote passam a ser cobrados individualmente, e isso se repete cada vez mais em vários setores, inclusive na aviação.
E a prova disso está nos números. As companhias aéreas brasileiras Azul, Gol e Latam faturaram R$ 1,9 bilhão em 2024 com a cobrança de bagagens despachadas, marcação de assentos e outros serviços extras, segundo levantamento divulgado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Desse total, R$ 1,1 bilhão veio das tarifas de bagagem e R$ 860 milhões das taxas de assentos, ambos os maiores valores já registrados desde o início da série histórica, em 2015.
A cobrança pelo despacho de bagagem, implementada em 2018, provocou um salto imediato nas receitas do setor. Hoje, todas as companhias mantêm o modelo, embora com regras diferentes: Gol e Latam cobram pela escolha antecipada de assento, enquanto a Azul ainda oferece uma janela gratuita de 24 horas antes do embarque.
O painel estatístico da Anac mostra que o primeiro trimestre de 2025 também quebrou recordes. No período, as taxas de bagagem renderam R$ 330 milhões, e as de assentos, R$ 242 milhões, os maiores valores já registrados para o intervalo desde o início do monitoramento.
Além dessas cobranças adicionais, as empresas aéreas também arrecadaram R$ 1,6 bilhão em 2024 com multas e tarifas relacionadas a cancelamentos, remarcações e reembolsos. Somente as multas por remarcação somaram R$ 858 milhões no ano passado.
Por outro lado, os custos com indenizações e assistências aos passageiros também aumentaram. De acordo com a Anac, as companhias desembolsaram R$ 664 milhões em condenações judiciais e R$ 638 milhões em assistência direta. As indenizações por atrasos chegaram a R$ 44 milhões, enquanto os danos a bagagens representaram R$ 13 milhões.
O avanço das receitas acompanha o ritmo de recuperação do transporte aéreo nacional. Em 2024, 118,3 milhões de passageiros viajaram pelo país, número muito próximo ao recorde de 2019, quando foram 118,6 milhões. Para a Anac, o aumento da demanda ajuda a explicar parte dos resultados, mas também evidencia a consolidação das receitas acessórias como uma importante fonte de lucro para o mercado aéreo brasileiro.
Para entender melhor o peso dessas cobranças, veja a tabela detalhada, separada por serviço e cia aérea:
Azul Linhas Aéreas
Passageiros: R$ 4,7 bilhões (79,5% da receita total com serviços aéreos)
Carga e mala postal: R$ 747,9 milhões (12,6%)
Penalidades: R$ 219,7 milhões (3,7%)
Bagagem: R$ 146,8 milhões (2,5%)
Marcação de assentos: R$ 57,3 milhões (1%)
Demais receitas auxiliares: R$ 43,7 milhões (0,7%)
Total: R$ 5,9 bilhões (100%)
Gol Linhas Aéreas
Passageiros: R$ 5,2 bilhões (86% da receita total com serviços aéreos)
Carga e mala postal: R$ 316,3 milhões (5,2%)
Penalidades: R$ 252,7 milhões (4,2%)
Bagagem: R$ 164,1 milhões (2,7%)
Marcação de assentos: R$ 64 milhões (1%)
Demais receitas auxiliares: R$ 40,8 milhões (0,7%)
Latam Airlines (Brasil)
Passageiros: R$ 5,3 bilhões (71,8% da receita total com serviços aéreos)
Carga e mala postal: R$ 822 milhões (11,1%)
Outras receitas: R$ 703,5 milhões (9,5%)
Penalidades: R$ 253,3 milhões (3,4%)
Bagagem: R$ 209,1 milhões (2,8%)
Marcação de assentos: R$ 61,2 milhões (0,8%)
Demais receitas auxiliares: R$ 46,2 milhões (0,6%)
Total: R$ 7,4 bilhões (100%)







