Uma nova superbactéria foi detectada no Brasil, recentemente, gerando grande preocupação entre especialistas. Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) analisaram essa bactéria, que demonstrou resistência a 15 antibióticos frequentemente utilizados em hospitais. Essa variante é conhecida como KPC, elimina os antibióticos e destrói suas partículas antes que possam penetrar nas células do nosso corpo. Esse é um alerta sério para a necessidade de novas estratégias no enfrentamento da resistência antimicrobiana, um problema que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), pode se tornar uma das maiores ameaças à saúde global nos próximos anos. O uso indiscriminado de antibióticos e a escassez global de novas drogas pioram a ameaça das superbactérias.
Durante nossa gestão no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a atenção não se voltou apenas para viroses emergentes e reemergentes, como Zika, Dengue, Chikungunya e, claro, a COVID-19, mas também para uma ameaça crescente: as superbactérias resistentes. Alertados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), estruturamos ações estratégicas para o enfrentamento da resistência antimicrobiana, um problema de escala global com potencial para causar milhões de mortes nos próximos anos.
A resistência antimicrobiana, que ocorre quando bactérias, fungos, vírus e parasitas desenvolvem resistência aos medicamentos, representa uma das maiores ameaças à saúde pública mundial. Embora o termo se aplique principalmente a bactérias, a resistência também pode afetar fungos e parasitas, resultando em infecções que são mais difíceis de tratar. Vírus, por sua vez, desenvolvem resistência em menor escala, mas a mutação viral que torna tratamentos ineficazes também é um risco global. Em 2019, essa resistência foi diretamente responsável por 1,27 milhão de mortes e associada a cerca de 4,95 milhões de óbitos em todo o mundo. Projeções da OMS indicam que, sem medidas eficazes, até 2050, 10 milhões de pessoas podem morrer anualmente devido à resistência antimicrobiana, alcançando o mesmo nível da taxa global de mortes por câncer em 2020. E até US$ 3,4 trilhões de perdas econômicas na economia mundial. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Pnuma, a resistência antimicrobiana está entre as 10 principais ameaças à saúde global.
Reconhecendo a gravidade dessa ameaça, consultamos cientistas brasileiros e especialistas de renome para elaborar um plano de ação robusto. Como resultado, em 2022, lançamos uma Chamada Pública, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com R$ 37 milhões destinados a financiar pesquisas voltadas ao enfrentamento da resistência antimicrobiana. Esse edital, com prazo final em setembro de 2022, contemplou seis linhas temáticas de pesquisa cuidadosamente estruturadas.
Essas linhas abrangiam desde o desenvolvimento de novos equipamentos de proteção individual e tecnologias inovadoras para sanitização de ambientes hospitalares, até o avanço no entendimento dos mecanismos que conferem resistência aos microrganismos. Também priorizamos a criação de redes de monitoramento e sequenciamento de cepas resistentes em todo o território brasileiro. Além disso, apoiamos ensaios clínicos focados no desenvolvimento de novos antibióticos ou aprimoramento dos já existentes, sempre visando garantir escalabilidade industrial em parceria com a indústria farmacêutica.
Com essa iniciativa, o Brasil não apenas se colocou na vanguarda do combate à resistência antimicrobiana, mas também reafirmou seu compromisso em colaborar com esforços globais para conter um dos maiores desafios de saúde do século XXI. É fundamental continuar monitorando e acompanhando de perto os resultados dessas pesquisas, assim como fizemos durante nossa gestão, para identificar rapidamente as soluções que podem ser escalonadas e implementadas no sistema de saúde. A batalha contra as superbactérias não pode esperar – e nós devemos estar prontos para agir.
Referências:
Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Global sobre Resistência Antimicrobiana. Disponível em: https://www.who.int.
Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Relatório sobre a Situação da Resistência Antimicrobiana nas Américas. OPAS, 2020. Disponível em: https://www.paho.org.
Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Antibiotic Resistance Threats in the United States. CDC, 2019. Disponível em: https://www.cdc.gov
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). Chamada Pública CNPq/MCTI/CT-Saúde Nº 52/2022 – Ações em Ciência, Tecnologia e Inovação para o Enfrentamento da Resistência Antimicrobiana. Disponível em: https://www.gov.br/mcti
Organização Mundial da Saúde (OMS). Projeções sobre o Impacto da Resistência Antimicrobiana até 2050. OMS, 2022. Disponível em: https://www.who.int