sexta-feira, 2 de maio de 2025

Rádio SOUCG

  • ThePlus Audio

Fiscalização de Suplementos: Urgência e Riscos à Saúde

Saulo Cruz/Agência Senado

Senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP); Senador Izalci Lucas (PL-DF); Senadora Dra. Eudócia (PL-AL); Conselheiro do Conselho Federal de Nutrição (CFN), Caio Victor Coutinho de Oliveira; Presidente da Associação Brasileira das Empresas de Produtos Nutricionais (Abenutri), Marcelo Bella. Audiência pública conjunta para debater o aumento da oferta de suplementos alimentares no mercado brasileiro sem o devido controle e fiscalização por parte das autoridades competentes.

O setor de suplementos alimentares se expande com velocidade impressionante, tanto no mercado nacional quanto no mundial. Esse crescimento foi impulsionado pelo avanço da ciência nutricional, pelas inovações em biotecnologia e pelos novos métodos de formulação e produção. Esse aumento reflete uma crescente preocupação da população com a saúde, o bem-estar e a prevenção de doenças. Apesar do crescimento promissor, esse avanço também traz à tona a necessidade urgente de uma fiscalização mais rigorosa para garantir a qualidade e a segurança dos produtos disponíveis no mercado.​

De acordo com a Pesquisa de Mercado da  ABIAD – Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres, cerca de 59% dos lares brasileiros possuem pelo menos uma pessoa que consome suplementos alimentares. Dados da  Future Marketing Insights (FMI) mostram que, no cenário mundial, o mercado de suplementos alimentares também apresenta uma trajetória ascendente. O estudo indica que o setor deve ultrapassar US$ 252 bilhões (R$ 1,25 trilhão) em 2025.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desempenha um papel fundamental na avaliação da eficácia e segurança desses produtos, estabelecendo limites máximos de ingestão diária de vitaminas e minerais, bem como critérios específicos para a inclusão de substâncias ativas em suplementos. ​

Um dos suplementos que tem ganhado destaque nesse mercado é a creatina, uma das substâncias mais populares no universo da musculação e do fitness, graças aos diversos benefícios que oferece tanto para o desempenho físico quanto para a saúde. Além de contribuir para o aumento da força e o fortalecimento muscular, estudos apontam que ela também pode trazer efeitos positivos para o funcionamento do cérebro e do coração.

Recentemente, a Anvisa divulgou o resultado da análise de 41 suplementos como a creatina. Apenas uma das marcas analisadas foi aprovada em todos os critérios do órgão. O setor apresentou melhora em comparação à análise realizada em outubro de 2024 pela Abenutri, quando 18 das 88 creatinas testadas foram reprovadas. A aprovação dos produtos depende principalmente da pureza da creatina, sendo aceita pela Anvisa uma diferença de até 20% a menos em relação ao valor declarado no rótulo. No relatório mais recente, observou-se uma maior conformidade quanto ao teor da substância, sem desvios significativos que configurassem infração sanitária. Entre as 41 marcas avaliadas, apenas uma apresentou teor de creatina inferior ao estabelecido, mas a Anvisa não revelou o nome da marca, pois o caso ainda está sob investigação administrativa.

Todas as marcas foram aprovadas no critério que busca a presença de matérias estranhas nos produtos. Já no quesito rotulagem, a maioria das marcas (40 das 41 analisadas) trouxe incorreções. Os erros mais comuns foram: a presença de alegações não permitidas nos rótulos, atribuindo à creatina benefícios que não são reconhecidos oficialmente, incluindo afirmações em outros idiomas. Também houve o uso de termos ou imagens que podem induzir o consumidor a interpretações equivocadas ou incompletas sobre o produto. Outras falhas incluem a tabela nutricional fora dos padrões exigidos, ausência da sua apresentação junto à lista de ingredientes, falta de informação sobre a frequência recomendada de consumo e o número de porções por embalagem, além da omissão das quantidades de açúcares totais e adicionados.

Regulamentação de Suplementos – Audiência Pública

A regulamentação de suplementos alimentares no Brasil enfrenta questões como a necessidade de atualização das normas em conformidade com as descobertas científicas mais recentes e a definição de critérios mais rigorosos para a inclusão de novas substâncias ativas. Além disso, é fundamental garantir uma fiscalização eficaz para assegurar o cumprimento das normas estabelecidas.

Diante disso, tornou-se imprescindível um debate aprofundado sobre os desafios regulatórios e os impactos da inovação científica nesse setor que envolvem a produção, fiscalização e comercialização de suplementos alimentares no Brasil. 

Devido a um requerimento de minha autoria ( REQ 6/2025 – CCT e  REQ 3/2025 – CTFC), realizamos em abril (23/04) uma audiência pública conjunta das Comissões de Ciência e Tecnologia (CCT) e de Fiscalização e Controle (CTFC) no Senado com os principais especialistas no assunto. Participaram do debate: Caio Victor Coutinho de Oliveira, Conselheiro Federal do Conselho Federal de Nutrição (CFN); Marcelo Bella, Presidente da Associação Brasileira das Empresas de Produtos Nutricionais (Abenutri) e Fernando Aith, Diretor do Centro de Pesquisa em Direito Sanitário da Universidade de São Paulo (USP).

Durante a audiência, tornou-se evidente a necessidade de uma regulamentação mais precisa e de investimentos em equipamentos laboratoriais adequados, como o cromatógrafo líquido, que é fundamental para a análise eficaz desses produtos. Destaco, aqui, a necessidade de fortalecer a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) com pessoal e mais recursos. 

Também destacamos o papel das redes sociais na disseminação de produtos com alegações sem comprovação científica, muitas vezes promovidos por figuras públicas. Os parlamentares defenderam maior rigor na fiscalização da publicidade desses suplementos e reforçaram a necessidade de investimentos em tecnologia para os órgãos de controle, especialmente para proteger os consumidores mais vulneráveis. 

Representantes da área da nutrição alertaram para os riscos do consumo de suplementos sem orientação profissional e para a escassez de informações confiáveis disponíveis ao público. Também foi mencionada a falta de preparo adequado sobre suplementação nos cursos de saúde, bem como os possíveis efeitos adversos de produtos como os pré-treinos, mesmo entre jovens saudáveis.

Por parte da indústria, foi defendida a segurança de suplementos com respaldo científico, como a creatina e o whey protein. No entanto, foram feitas críticas à limitação da estrutura da Anvisa para fiscalizações eficazes. De acordo com dados apresentados, entre 30% e 50% dos itens analisados apresentaram irregularidades, incluindo casos em que não havia qualquer presença da substância prometida.

Especialistas também apontaram que, apesar de avanços na regulamentação do setor desde 2018, ainda existem conflitos sobre ingredientes e dosagens permitidos. Um dos pontos mais controversos é a autorização para que pessoas físicas importem suplementos do exterior, muitas vezes com composições proibidas no Brasil, o que, segundo os debatedores, prejudica a indústria nacional e desestimula a inovação.

Ao final, foi reafirmado o compromisso do Legislativo com o fortalecimento da regulação do setor, a modernização do marco legal e o aumento da autonomia e da capacidade técnica da Anvisa.

A fiscalização no Brasil: onde estamos e o que falta?

Atualmente, a responsabilidade de fiscalização dos suplementos alimentares é da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), cujo objetivo é estabelecer regras de fabricação, comercialização e rotulagem dos produtos.

Em 2018, a ANVISA estabeleceu a IN Nº 28 com as listas de constituintes, de limites de uso, de alegações e de rotulagem complementar dos suplementos alimentares. Estão no documento as seguintes informações:

Lista de Constituintes: Lista com a definição do que são as substâncias que podem ser usadas nos suplementos como as vitaminas, minerais, aminoácidos, proteínas, substâncias bioativas, enzimas, prebióticos e probióticos.

Limites de Uso: dependendo do grupo populacional, a IN estabelece limites máximos e mínimos e a recomendação diária de consumo.

Rotulagem e Rotulagem Complementar: o documento caracteriza as alegações que podem ser feitas e os requisitos para rotulagem complementar.

Teste de Estabilidade: exigência de testes de estabilidade para garantir maior segurança do produto a longo prazo. Este fator será obrigatório, no Brasil, a partir de 01 de outubro de 2025.

Mesmo com o avanço da  regulamentação, a agência enfrenta desafios como escassez de recursos, a alta demanda do mercado e a velocidade de novos produtos oferecidos. Algumas brechas que ainda existem acabam fazendo com que produtos sem comprovação de segurança ou eficácia sejam oferecidos ao consumidor.

O consumo indiscriminado

Por serem vendidos livremente, as pessoas acabam acreditando que os suplementos alimentares não causam mal, mas não é verdade. Consumi-los de forma indiscriminada e sem orientação de um profissional de saúde pode representar sérios riscos à saúde. Altas doses de vitaminas, minerais ou outras substâncias podem sobrecarregar órgãos como o fígado e os rins, provocar alterações hormonais e até desencadear reações alérgicas ou cardiovasculares. 

É importante ficar atento, também, à combinação inadequada entre diferentes tipos de suplementos ou entre suplementos e medicamentos. Algumas combinações podem gerar efeitos colaterais inesperados e perigosos. A ausência de informação correta pode provocar interações medicamentosas graves, sobrecarga metabólica e outros efeitos adversos ainda pouco conhecidos.

Um fator agravante é a presença de produtos falsificados ou mal rotulados no mercado. Suplementos vendidos sem registro ou com informações enganosas podem conter substâncias proibidas, contaminantes ou concentrações que não correspondem ao descrito na embalagem.

Com alegações enganosas e formulações adulteradas, observamos diversos produtos comercializados atualmente com a composição divergente da informada em seus rótulos, podendo conter substâncias não regulamentadas ou em concentrações inadequadas. A ausência de padronização e rastreabilidade na cadeia produtiva compromete sua eficácia e segurança, podendo gerar efeitos adversos significativos para os consumidores.

A facilidade de compra online agrava ainda mais o cenário, colocando o consumidor em situação de risco.

Propostas e soluções para melhorar a segurança no setor

Durante uma audiência pública, alguns especialistas comentaram que o real problema é juntar uma fiscalização mais firme com iniciativas públicas voltadas para ensinar e conscientizar o pessoal. Eles destacaram que, na maioria dos casos, intensificar o combate à falsificação de suplementos e ajustar as inspeções sanitárias anda de mãos dadas com a necessidade de as empresas se mostrarem mais transparentes por meio de medidas bem definidas. Do mesmo modo, vale reforçar que atualizar as normas de forma contínua – para acompanhar de perto as novidades do setor – e implantar canais de denúncia facilmente acessíveis aos consumidores são passos fundamentais para garantir um sistema mais efetivo e seguro.

Investir nesse setor não pode ser deixado de lado, por exemplo, na realização de testes que analisam fatores como a temperatura, umidade, luz e até o decurso do tempo mexem na composição dos suplementos. Assim, fica mais fácil confirmar se os ingredientes ativos continuam firmes e se, de modo geral, não acabam surgindo substâncias indesejáveis ou mesmo tóxicas. Essa etapa é importante no processo de fabricação dos suplementos para garantir a qualidade do produto, além de sua segurança, eficácia e prazo de validade.

A negligência dessas ações fará com que o Brasil continue inserido em um cenário de mercado que, mesmo exibindo um rápido progresso, funciona com ameaças à proteção e ausência de compromisso.

A saúde deve vir em primeiro lugar

O uso de suplementos alimentares, quando orientado por profissionais da saúde e baseado em evidências científicas, pode trazer inúmeros benefícios para a qualidade de vida, desempenho físico e prevenção de doenças. Por isso, é essencial que o marco regulatório continue evoluindo em sintonia com as descobertas científicas e com o crescimento do setor. Mesmo com o avanço da regulamentação, ainda há muito a ser feito para garantir que os suplementos disponíveis no mercado sejam seguros, eficazes e corretamente informados ao consumidor. 

A boa notícia é que o Brasil já conta com uma base regulatória sólida, e iniciativas como as audiências públicas e a destinação de recursos para modernizar a fiscalização são passos importantes na direção certa. O consumo responsável de suplementos deve ser incentivado, sobretudo como ferramenta complementar à alimentação saudável e ao estilo de vida ativo. Com mais investimento, transparência e responsabilidade, é possível tornar esse mercado ainda mais seguro e acessível para toda a população.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG

tecnologia.ig.com.br

Enquete

O que falta para o centro de Campo Grande ter mais movimento?

Últimas