sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

La Mezcla: um podcast para quem ama a cultura da América Latina

No universo dos tocadores, os podcasts ganham cada vez mais espaço.

Há programas para todos os gostos: política, comportamento, esportes, humor, e sobre os mais variados assuntos.

Para os amantes da latinidade, temos o podcast La Mezcla, dedicado à cultura e à música latina, que é comandado por Miriam Soares.

Ele foi criado em 2022 e, entre seus objetivos, está a busca de uma aproximação com o público brasileiro, com a diversidade cultural da América Latina e o fortalecimento da consciência de latinidade.

Aqui oferecemos uma entrevista exclusiva, feita com a podcaster Miriam Soares, que fala sobre seu programa e a importância desse trabalho.

La Mezcla

O que é o podcast La Mezcla? Quando surgiu?

É um podcast que fala sobre as misturas culturais da América Latina e tem a meta de evidenciar que não existem culturas puras, que tudo o que somos e fazemos vem de algum outro lugar e está mesclado e reinterpretado de muitas maneiras.

A coisa é tão misturada que temos episódios em português, espanhol, portunhol y una mezcla de los tres.

Em algumas entrevistas também mencionam idiomas que convivem com o espanhol como quéchua, aymara, euskera, mapundungun.

Falamos de línguas, identidade, jornalismo, música, artes visuais, literatura, migrações, colonização, história, educação e mais um monte de outras coisas relacionadas às culturas latino-americanas (assim, no plural mesmo porque não existe uma cultura única).

Eu quero que o La Mezcla sirva como ponte entre toda a diversidade cultural da nossa região e que ao nos conhecermos melhor, possamos nos sentir latino-americanos que somos.

Quando a latinidade entrou na sua vida?

No mesmo dia que eu nasci. Ao ser brasileira, sou latino-americana.

No entanto, só fui começar a tomar consciência disso aos 18 ou 19 anos, quando comecei a entrar em contato com migrantes em São Paulo.

E um tempo depois passei 3 anos viajando pela América do Sul e Espanha como trabalhadora do setor turístico.

Foi quando percebi que não havia nada de exótico em ser latino-americana.

Que a realidade de tantos países e culturas diferentes entre si também tinha muitas camadas em comum.

Depois, fiz uma disciplina do Prof Dr. Renato Seixas como ouvinte no PROLAM – USP (Programa de Integração da América Latina).

Isso me rendeu uma belíssima base de leituras sobre identidade e hibridismo cultural de autores como Néstor García Canclini, Tzvetan Todorov, Chimamanda Adichie, Edward Said, Pierre Bourdieu.

Isso me ajudou a fundamentar e sedimentar os conhecimentos que eu havia adquirido nas viagens.

Nesse meio tempo, fiz uma transição de carreira.

Saí do turismo e me tornei professora de espanhol, com o objetivo duplo de transmitir o que fui aprendendo ao longo do caminho e me permitir estudar melhor o que eu já gostava de pesquisar.

Destaques

Até hoje, você já realizou 58 programas no La Mezcla. Quais deles você destacaria?

É difícil escolher porque todos os entrevistados são importantes de muitas maneiras.

Mas me sinto especialmente orgulhosa de ter tido a oportunidade de conversar com algumas pessoas mais conhecidas publicamente como Ariel Palacios, correspondente da Globo News, sobre os estereótipos argentinos.

Também com Hugo Fattoruso, músico uruguaio, sobre as suas vivências com músicos brasileiros de renome.

São programas que tiveram um retorno muito bacana dos ouvintes.

Não posso deixar de destacar também as entrevistas com os historiadores Leonardo Marques sobre história colonial, Vinicius Juberte, sobre os usos atuais da figura de Simón Bolívar, o meu colega professor de espanhol Diego José sobre o portunhol e os preconceitos contra argentinos e argentinas.

São tantos que recomendo a quem nos lê que ouçam todas as entrevistas para aprender o que cada convidado e convidada tem a dizer sobre as culturas latino-americanas.

Como você trabalha a pauta do podcast?

Eu tenho uma espécie de radar mental ligado permanentemente para ver quem está produzindo e falando sobre cultura latino-americana.

As redes sociais e outros podcasts me ajudam muito nisso.

Vão me sugerindo conteúdos e vou separando o joio do trigo.

Além disso, tenho uma longa lista de temas que quero abordar e vou procurando os melhores especialistas em cada um dos assuntos.

Esses temas geralmente envolvem questões pouco conhecidas pelo público brasileiro ou destrinchar estereótipos para ver o que realmente está por trás deles.

Chimamanda Adiche, escritora nigeriana em seu TED “Os Perigos da História Única” diz: “O problema dos estereótipos não é que eles sejam falsos, mas sim que eles são incompletos e perigosos porque reduzem as pessoas e as culturas a uma narrativa única, roubando-lhes a dignidade e dificultando a compreensão mútua.”

A partir disso considero que meu papel é ser essa ponte cultural para aprofundar o conhecimento intercultural latino-americano.

Procuro fazê-lo com essa base acadêmica, mas de forma prática e compreensível para um público mais amplo, fugindo da linguagem prolixa dos teóricos das humanidades.

Retorno

Como o público tem recebido o La Mezcla?

Felizmente muito bem mesmo! Recebo muitos elogios online e offline.

Acredito que o La Mezcla tem cumprido seu papel de conectar culturas.

Em 2025 fiz uma série de melhorias no podcast como gravar em vídeo, publicar cortes, entrar em novas redes sociais, o que tem permitido um crescimento muito significativo.

Já tenho até alguns haters que ocasionalmente comentam nas redes sociais xingando o conteúdo.

Acho ótimo porque quer dizer que tenho gerado algum alcance fora da minha bolha.

Segundo a retrospectiva do Spotify, tive um aumento de 999% de audiência nova só nessa plataforma em relação ao ano anterior.

O que é um resultado impressionante para um projeto tocado por uma pessoa só e sem patrocínio.

Espero que para 2026 esse número se transforme em algum retorno financeiro em forma de anúncios e financiamento coletivo para poder criar pontes culturais mais longas e ousadas.

No que a realização do La Mezcla impacta positivamente nas suas outras atividades?

Tem servido muito como vitrine das minhas aulas de espanhol, que são bem diferenciadas porque tratam a língua muito além de um instrumento de comunicação.

Nas aulas meus alunos aprendem a língua dentro de seus contextos culturais, políticos e históricos.

Tem rendido convites para dar palestras, cursos especiais e isso me enche de alegria.

Como você vê a atual produção latina e o que destacaria?

Tudo o que se faz desde o Río Bravo, na fronteira do México com os EUA (inclusive pelos migrantes latinos nas terras yankees) até a Terra do Fogo é produção latina.

Sei que pode parecer uma picuinha terminológica, mas é importante procurarmos falar da América Latina incluindo o Brasil.

Levando isso em conta, considero importante destacar o papel do reggaeton e do funk, em especial na figura de  Bad Bunny e Anitta como pontas de lança na integração cultural latino-americana.

Não são estilos musicais de que eu pessoalmente goste, mas a importância deles é inegável nesta quadra da história.

Tenho aprendido também sobre um importante movimento de bandas de cumbia brasileira como Bazuros, La Cumbia Artificial, Eduardo Barbosa e Mecato, que foram entrevistados do La Mezlca, entre muitos outros.

A cumbia é um ritmo que está presente em diferentes estilos em toda a região e é crucial termos também a nossa interpretação desse tipo de música.

Dê uma mensagem final a quem nos lê…

Eu gostaria de convidar seus leitores a conhecerem o La Mezcla podcast e o trabalho que nossos entrevistados e entrevistadas realizam, cada um na sua área, para criar e difundir as culturas latino-americanas.

A língua não é, nem nunca foi, uma barreira para nos conhecermos melhor enquanto vizinhos.

Muitos sabem tudo sobre heavy metal nórdico, divas pop estadunidenses e culinária francesa, mas não conhecem nada da Argentina além do Maradona, ou do México além de mariachis e narcotráfico.

Quero animar quem lê esta coluna a ir além do que está na superfície cujo acesso é mediado por culturas e mídias hegemônicas. Como diria o famoso e sábio E.T. Bilú: “Busquem conhecimento”.

Audição

O podcast La Mezcla pode ser ouvido no Spotify, YouTube ou Amazon Music.

Esta coluna é um espaço destinado à cultura e músicas latinas. Mais informações sobre esses temas você encontra em www.ondalatina.com.br   e no Canal Onda Latina: https://www.youtube.com/@canalondalatina

Assista um episódio do La Mezcla no YouTube:

gente.ig.com.br

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