Com uma carreira construída ao longo de mais de três décadas, Carmo Dalla Vecchia se consolidou como um dos atores mais versáteis da sua geração. Presente na televisão, no teatro e no cinema, ele transitou por diferentes gêneros, formatos e linguagens, construindo uma trajetória marcada por consistência, escolhas conscientes e uma relação profunda com a arte de interpretar.
Natural do Rio Grande do Sul, Carmo deixou o interior ainda muito jovem para apostar em um caminho incerto, mas necessário. A mudança para o eixo Rio–São Paulo marcou o início de uma jornada profissional que exigiu coragem, disciplina e persistência. Desde então, o ator acumulou personagens que dialogam com o público e com seu próprio tempo, acompanhando as transformações da dramaturgia brasileira.
Ao longo dos anos, sua carreira também passou a refletir debates importantes sobre representatividade, identidade e diversidade. Carmo se tornou uma voz ativa ao falar sobre sexualidade, preconceito e liberdade de existir, não apenas como ator, mas como cidadão e comunicador, ampliando o alcance do seu trabalho para além da ficção.
Atualmente, além de novos projetos e de uma presença constante nos palcos e nas redes sociais, Carmo vive a experiência da paternidade, etapa que ressignificou sua relação com o mundo, com o público e com a própria arte. Para a coluna, o ator concedeu uma entrevista em que fala sobre carreira, amadurecimento, teatro, mercado audiovisual e o legado que deseja deixar. Confira:
Carmo, você construiu uma trajetória sólida entre novelas, teatro e cinema. Quando olha para trás, qual foi o ponto de virada que te fez perceber que a arte seria seu caminho definitivo?
Eu saí de casa jovem demais, tinha 19 anos. Não tinha o conforto de não poder dar certo. Tinha que dar. Isso não me deixava desistir, ou precisaria voltar para o interior e eu não queria isso.
Como você se vê hoje em relação ao início da sua carreira? O que mudou no Carmo lá do começo para o Carmo de agora — artista, pai, homem livre e maduro?
O que sou hoje é o resultado de todas as minhas histórias. Se a gente insiste num assunto, acaba evoluindo nele. Acho que isso é meio regra geral.
Você esteve em cartaz com a peça Corte Fatal. Pode contar um pouco sobre essa experiência? Como nasceu o convite e o que mais te atraiu na história?
O espetáculo estava em cartaz em São Paulo, agora já terminou. O personagem era um gay dono de salão de beleza, muito extrovertido. É gostoso falar da minha natureza e brincar com os clichês que as pessoas esperam de um homem viado e poder contrariar isso também. Existem viados de todos os tipos, até mesmo na comédia. Acho que as pessoas se surpreendiam com o fato de eu não ter preconceito nenhum com o assunto. Infelizmente ainda é tabu, o preconceito é gigantesco, principalmente nas dramaturgias a respeito da minha comunidade.
O mercado mudou muito nos últimos anos, com TV, teatro, cinema e streaming convivendo ao mesmo tempo. Como você enxerga esse cenário atual?
Streaming ou novela, ainda estamos falando de audiovisual. Nossa profissão mudou muito. Ela era uma profissão inspiracional, havia a fantasia de se lucrar muito com ela. Atualmente virou uma profissão de missionários que amam o que fazem. Durante muitos anos, a TV permitiu que muitos atores tivessem sua casa própria. Isso acabou um pouco. Se tornou muito mais para uma minoria do que já era. Fica quem não consegue viver sem.
Você já falou abertamente sobre sua sexualidade e sobre viver sem medo de julgamentos. Acredita que essa postura ajuda outras pessoas da comunidade LGBTQIAP+?
Tenho certeza disso. Sou parado nas ruas hoje muito mais pelo serviço que presto à comunidade do que por qualquer novela que tenha feito.
Como pai, artista e comunicador, que legado você gostaria de deixar para o seu filho e para o público que te acompanha há tantos anos?
Seja livre para ser aquilo que você quer ser. Minha geração aprendeu com os pais o oposto disso. “Obedeça”, “segura o choro”, “não seja sensível”. Para as mulheres era pior ainda: “case virgem”, “feche as pernas”, “não seja vulgar”. A pressão era ainda maior.
E olhando para o futuro — se pudesse se ver daqui a cinco anos — como se imagina profissionalmente?
Atuando sempre. Dirigir não está nos meus planos. E escrever coisas minhas.











