Sustentável já não basta. Quando o solo perde vida, a água escorre sem infiltrar e a renda do produtor oscila ao sabor do clima e dos preços, “não piorar” já é arriscar demais. A boa notícia é que existe um novo jeito de produzir alimentos que vai além de evitar danos: ele busca recuperar o que foi perdido.
Cada vez mais produtores brasileiros estão adotando práticas regenerativas — um conjunto de cuidados que, ao mesmo tempo, aumentam a produtividade e melhoram a saúde do solo, da água e da biodiversidade. Não é ideologia, é técnica. É usar o que funciona: bioinsumos, agricultura de precisão, plantio direto, rotação de culturas, adubos verdes, manejo integrado de pragas, compostos orgânicos, sensores, inteligência artificial e, quando necessário, defensivos aplicados com critério. A lógica é simples: solo vivo é um ativo; água protegida é garantia de produção; biodiversidade é aliada contra pragas e doenças.
Na prática, isso significa cultivar de forma a ter sempre cobertura no solo, diversificar plantas ao longo do ano, reduzir revolvimento, medir a qualidade da terra e da água e, pouco a pouco, depender menos de insumos caros e mais dos serviços que a própria natureza oferece — como infiltração de água, fixação de nitrogênio e controle biológico. É menos impacto, sim, dentro dos limites da Anvisa, chegando a reduzir em mais de 80% o uso dos antigos defensivos, mas também é mais vida e mais estabilidade na produção.
E por que isso deveria interessar a quem vive na cidade? Porque regenerar também é social. É reduzir perdas, garantir alimentos de qualidade com preço mais estável, e contar a história de onde e como a comida foi produzida. É reconectar o campo e a cidade pela confiança — e confiança se constrói mostrando, não prometendo.
O feijão é um dos alimentos que mais pode se beneficiar e ajudar nessa transformação. Como leguminosa, ele fixa nitrogênio no solo, diminuindo a necessidade de adubos químicos. Quando entra na rotação com outras culturas, ajuda a quebrar ciclos de pragas e doenças e melhora a estrutura do solo. Muitos produtores que já adotam práticas regenerativas também cultivam soja, milho, trigo ou cevada — e incluir o feijão nesse modelo dilui custos e leva ao consumidor um produto que ele conhece, consome e valoriza todos os dias.
Além disso, o feijão é parte da identidade brasileira. Está na feijoada de sábado, no prato feito do almoço, nas receitas regionais. Falar de feijão regenerativo é falar de comida de verdade, de saúde no prato e de renda no campo. É uma narrativa fácil de entender: solo vivo, água protegida, biodiversidade equilibrada e indicadores que comprovam tudo isso.
Claro que há desafios. Produzir de forma regenerativa exige planejamento, disciplina e visão de médio prazo. Os resultados não vêm todos de uma vez, mas se acumulam a cada safra: solos mais férteis, lavouras mais resistentes a extremos climáticos, menos perdas e mais competitividade — inclusive em mercados que pagam mais por produtos com origem e práticas comprovadas.
O chamado é simples: apoiar e escolher alimentos produzidos com responsabilidade. Quando o consumidor entende a diferença e valoriza quem produz assim, ajuda a escalar um modelo que devolve vida ao campo e confiança à mesa.
Sustentabilidade freia o dano; regeneração recupera a capacidade produtiva e a reputação da agricultura brasileira. E, com o feijão liderando essa conversa, todo mundo sai ganhando.
*Marcelo Lüders é presidente do Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe), e atua na promoção do feijão brasileiro no mercado interno e internacional
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