sábado, 19 de abril de 2025

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Estatal no vermelho e luxo no palco

Najara Araujo/Câmara dos Deputados

Ministro da Ciência,Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, em 06/08/2019. Reunião ordinária da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP), da Câmara dos Deputados, com o comparecimento do Ministro sobre a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

O Brasil enfrenta um momento preocupante de desgoverno nas estatais, caracterizado por déficits crescentes, desperdício de recursos e prioridades distorcidas com as necessidades da população. Os Correios, que já foram um símbolo de eficiência e orgulho nacional, hoje representam um exemplo claro desse colapso anunciado. A empresa acumula prejuízos bilionários, atrasa salários, compromete benefícios dos servidores e padece em uma crise operacional sem precedentes. Mas destina milhões de reais a patrocínios que nada têm a ver com sua missão institucional.

É revoltante e desesperador ver o desrespeito com o trabalhador e com o cidadão que depende dos serviços básicos prestados pela estatal. Não se trata apenas de números negativos, mas de uma gestão marcada pelo improviso, ideologia e irresponsabilidade, que transforma uma instituição centenária em um instrumento político.

Diante disso, apresentei propostas para mudar essa realidade. Propus um projeto de lei que limita os gastos com publicidade e patrocínios em empresas públicas que operam no vermelho, restringindo essas despesas a, no máximo, 10% do superávit do ano anterior. E solicitei à Advocacia do Senado a elaboração de uma representação formal ao Ministério Público Federal e ao Tribunal de Contas da União, para que sejam apurados os possíveis desvios e identificadas as responsabilidades pela má gestão nos Correios. A transparência, a ética e o respeito ao dinheiro do contribuinte precisam ser restaurados com urgência

A economia não aceita mentiras, não aceita atalhos, não aceita transferência de culpa. Ela nos mostra que não estamos presenciando políticas de Estado pensadas para o bem-estar duradouro da nação, mas sim ações de curto prazo, com um forte apelo eleitoral, que ignoram os riscos fiscais e a sustentabilidade econômica do nosso país.

Não podemos permitir que interesses pessoais políticos comprometam o futuro das nossas instituições.

Os números não mentem. O déficit das estatais mostra o sintoma de um modelo esgotado de política econômica

As estatais brasileiras acumulam, já no início de 2025, um déficit de R$ 707 milhões, revelando, mais uma vez, um problema estrutural persistente no setor público: a má gestão e o uso ideológico das empresas estatais. Esses dados expõem fragilidades que não podem ser ignoradas.

As estatais federais lideram o prejuízo com um rombo de R$ 989 milhões. Enquanto isso, algumas estatais estaduais conseguem apresentar superávit, o que prova que é possível administrar com responsabilidade — desde que haja vontade política e competência.

O governo argumenta que o déficit é consequência de investimentos estratégicos, mas essa justificativa não elimina a necessidade de um debate mais amplo sobre a situação fiscal dessas empresas. Segundo o governo, os resultados negativos não indicariam desequilíbrio fiscal, pois os investimentos teriam sido feitos com recursos em caixa. Um argumento conveniente que mascara a realidade. O problema é que esse tipo de explicação ignora o contexto. Não se trata apenas de comparar receitas e despesas de forma isolada, mas de avaliar se há, de fato, eficiência nessas operações. É preciso saber se são produtivos e se geram retorno. Ou estão sendo feitos sem planejamento, apenas para justificar o aumento da máquina pública.

Mas, como afirmei acima, os números não mentem: o setor estatal brasileiro opera com desequilíbrio crônico. Esse modelo de gestão prioriza a expansão do Estado (não do povo) em detrimento da responsabilidade fiscal, insistindo em utilizar as estatais como instrumentos políticos, e não ao interesse público. Nesse modelo, quando os números desagradam, o discurso prevalece, desqualificando a metodologia do Banco Central ou de outra instituição. É essencial que o governo adote medidas que combinem responsabilidade fiscal com investimentos estratégicos, garantindo que as estatais cumpram seu papel sem comprometer o equilíbrio econômico do país.

Correios: um patrimônio nacional em risco

Acredito que todos saibam o carinho que tenho pela empresa dos Correios. Uma das estatais mais tradicionais do Brasil, com mais de 350 anos de serviços prestados à população.

Durante minha missão na Estação Espacial Internacional, tive a oportunidade de realizar algo especial: inaugurar, simbolicamente, um selo no espaço. Esse momento marcante, ocorrido em 2006, foi o ponto de partida para uma relação mais próxima com os Correios e, especialmente, com os carteiros. Fui até mesmo reconhecido como patrono dos carteiros, um título que obtive com grande satisfação e que reforçou minha admiração pelo trabalho desses profissionais.

Além disso, com muita honra, aceitei o desafio de ser o Ministro das Comunicações (2019-2020), durante a gestão do Presidente Jair Bolsonaro na Presidência da República. Tratei a empresa com a capilaridade que tem, com respeito e com muito profissionalismo. E tivemos resultados: em 2020, registramos mais de R$ 1,5 bilhão em lucro. Em 2021, superamos R$ 2,7 bilhões – o maior lucro da história. E, em 2022, mesmo com todos os desafios, ainda mantivemos superávit. Conheço de perto os desafios e a força dessa instituição. E tudo foi conquistado sem demissões em massa, valorizando os servidores, investindo em eficiência e modernização, principalmente para acompanhar o crescimento do comércio eletrônico. Os Correios voltaram a ser símbolo de excelência no serviço público. Mas, infelizmente, essa trajetória positiva foi brutalmente interrompida.

E é com tristeza que alerto sobre uma ameaça concreta e iminente: o colapso dos Correios. A estatal está à beira de um apagão operacional e financeiro sem precedentes. E o pior: esse desastre é evitável. Em apenas dois anos, a atual gestão levou a empresa a um déficit de R$ 3,2 bilhões. Em 2023, o prejuízo já era de R$ 440 milhões. No setor internacional, a perda foi de R$ 2,2 bilhões, em parte devido à malfadada e impopular “taxa das blusinhas”.

Agora, a situação chegou ao limite: há relatos concretos de transportadoras contratadas que estão há mais de 60 dias sem receber. Os pagamentos vêm sendo feitos de forma aleatória e parcial, sem transparência, sem explicações, sem respostas institucionais.

A cultura do desperdício: patrocínio milionário em meio ao colapso dos Correios

E nesse momento crítico, enfrentando uma das piores crises financeiras da história e acúmulos de prejuízo de mais de R$ 2 bilhões somente este ano (2025), a estatal decidiu desembolsar R$ 4 milhões para patrocinar a turnê do cantor Gilberto Gil, cujos ingressos chegam a R$ 1,5 mil.

Esse patrocínio ocorre em um período de dificuldades para os trabalhadores da empresa, que denunciam atrasos nos repasses ao FGTS, o descredenciamento do plano de saúde, tornando o acesso a serviços médicos cada vez mais precário, além de motoristas terceirizados da estatal acumularem mais de dois meses sem receber. Enquanto milhares vivem na incerteza do amanhã, os recursos públicos estão sendo canalizados para shows e eventos. Você consegue imaginar o que um funcionário sente sobre isso? A decisão levanta um debate essencial: quais devem ser as prioridades da estatal? Isso só pode ser classificado como um desrespeito à população e aos próprios funcionários.

Esse cenário é revoltante. A empresa não consegue honrar compromissos básicos, mas resolve bancar shows que já tem outros patrocinadores como a marca de luxo Rolex. Infelizmente, não é a primeira vez. Este ano, a empresa já destinou mais de R$ 1 milhão para outros eventos do governo, como o Encontro de Novos Prefeitos e Prefeitas, realizado em Brasília.

Nessa gestão, a prioridade não é o trabalhador nem o cidadão brasileiro. Como explicar isso? Como justificar esse gasto diante da realidade vivida por quem depende dos Correios? Os eventos têm o seu valor, mas estão longe de ser prioridade diante de uma estatal mergulhada em dívidas.

Os Correios, que deveriam ser um símbolo de serviço público eficiente, estão sendo transformados em um instrumento de marketing ideológico e cultural, com patrocínios seletivos, pouco transparentes e completamente desviados das necessidades reais da empresa e da população.

Cultura e controvérsias: o papel da transparência e da ética na gestão pública e no setor cultural

A ministra da Cultura está no centro de um debate que vai além das artes e da cultura. Ela terá de se explicar à Câmara dos Deputados sobre uma série de denúncias que pesam contra sua gestão. O convite para depor em uma audiência pública, marcada para o próximo dia 16, promete trazer à tona questões que envolvem o uso de recursos públicos e a ética na gestão cultural. 

Não se trata apenas de políticas públicas para fomentar a arte ou de incentivo à produção cultural, mas de algo muito mais grave: o uso político, ideológico e até pessoal de estruturas que deveriam servir à população — e não a interesses partidários ou pessoais. Entre os pontos de maior preocupação está a apresentação em shows da ministra em eventos pagos com recursos públicos durante seu recesso e que custaram R$ 640 mil. Em qualquer democracia, isso soaria no mínimo como um conflito de interesses. Parlamentares questionam se essas contratações violaram o princípio da impessoalidade e se houve favorecimento político. 

Deputados da oposição querem saber: a ministra utilizou sua posição no governo para impulsionar sua carreira artística? E mais: os recursos do ministério estão sendo desviados para bancar campanhas disfarçadas de ações culturais? São perguntas legítimas, que o povo brasileiro tem o direito de ver respondidas. A cultura não pode ser usada como palanque ideológico ou balcão de negócios.

O ambiente cultural, que deveria ser um espaço plural, de liberdade de expressão e diversidade de pensamento, vem sendo capturado por uma militância ideológica intolerante. O caso dos shows cancelados da banda Ira! também ilustra como a cultura pode se tornar palco de polarizações políticas. Após o vocalista Nasi pedir que apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro saíssem do local, quatro shows foram cancelados no Sul do país, gerando reações intensas de ambos os lados do espectro político.

Não é papel do artista selecionar sua plateia com base em posicionamento político. A arte, quando verdadeira, é feita para todos. A cultura, quando bem administrada, aproxima pessoas — não as separa. A cultura é uma parte essencial da identidade do Brasil, mas sua gestão deve ser pautada pela transparência e pelo compromisso com o interesse público. O uso de recursos públicos para fins culturais deve ser sempre acompanhado de critérios claros e de uma prestação de contas rigorosa.

Correios no vermelho e bancando turnê de artista? Basta! Dinheiro público não é brinquedo: projeto de lei para frear gastos abusivos

Diante dessa situação, medidas urgentes são necessárias para garantir que os recursos públicos sejam utilizados de forma responsável e alinhada com as necessidades da população. Por isso, tomei duas medidas imediatas.

  1. 1.     Determinei à minha equipe a elaboração de um Projeto de Lei que proíba gastos com patrocínios e publicidade por parte de empresas públicas e sociedades de economia mista que operem no vermelho. A proposta limitará esse tipo de despesa a, no máximo, 10% do superávit do ano anterior — o que significa, na prática, que quem dá prejuízo, como os Correios atualmente, ficará impedido de esbanjar em ações que em nada beneficiam a população.
  2. 2.     Solicitei à Advocacia do Senado a elaboração de uma representação formal ao Ministério Público Federal e ao Tribunal de Contas da União para que sejam apurados os possíveis desvios e identificadas as responsabilidades pela má gestão nos Correios. É fundamental que sejam investigadas eventuais irregularidades, bem como identificados os responsáveis pela má gestão que levou os Correios a essa situação.

Chega de usar estatal como palanque ideológico. Empresas públicas têm que servir ao cidadão, e não aos amigos do governo. O uso indevido de recursos públicos não pode passar impune. O brasileiro está pagando o preço de uma administração irresponsável e ideológica. Temos visto o velho aparelhamento estatal do uso do dinheiro público para privilegiar amigos e projetos alinhados a interesses políticos, em vez de resolver os problemas reais da população e dos servidores.

É justamente contra esse tipo de distorção que estou lutando. No Senado, meu papel é fiscalizar, propor mudanças e garantir que o Brasil seja governado com responsabilidade. O que está em jogo aqui não é um simples patrocínio, mas o respeito ao dinheiro do cidadão e à função pública.

É preciso resgatar a excelência da gestão pública com uma gestão técnica, transparente e ética, colocando fim ao uso político das verbas públicas, pelo respeito ao povo brasileiro, que paga impostos e espera que eles sejam usados com responsabilidade. E esse respeito precisa ser restaurado.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG

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