Um dos filmes mais comentados nas premiações internacionais e forte candidato ao Oscar, Anora, do cineasta estadunidense Sean Baker (de Projeto Florida e Red Rocket), é uma comédia dramática com estreia prevista para janeiro nos cinemas. O longa, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes deste ano, tem atraído a atenção tanto o público quanto da crítica.
A trama acompanha Ani Mikheeva, uma jovem stripper que trabalha em um clube de luxo em Manhattan. Fluente em russo, em uma noite ela é apresentada a Vanya Zakharov (Mark Eydelshteyn), o filho imaturo de um oligarca russo, que está nos Estados Unidos supostamente para estudar, mas prefere festas e videogames. Vanya paga Ani para passar uma semana com ele e fingir ser sua namorada, o que desencadeia um romance inesperado que culmina em um casamento impulsivo em Las Vegas. Além do interesse mútuo, há um acordo no meio: Vanya espera usar o casamento para obter um green card e permanecer nos EUA. Mas logo que a união é descoberta pela família de Vanya, uma série de eventos tensos passam a acontecer, incluindo a fuga do rapaz e a busca frenética por ele liderada por Ani e pelos capangas enviados por seus pais.
Embora a premissa possa parecer simples para um filme premiado, Anora se destaca por suas camadas narrativas e a qualidade das atuações, especialmente a de Mikey Madison (Pânico V). A atriz oferece uma performance muito precisa, transformando Ani de uma personagem submissa e vulnerável (como se espera de uma garota de programa) para uma mulher determinada e em fúria, que enfrenta as adversidades com fúria crescente ao perceber a manipulação de que foi vítima. Ao longo da trama, a ambiguidade sobre os reais sentimentos de Ani por Vanya adiciona complexidade: seria o casamento apenas uma oportunidade de melhorar de vida ou haveria ali espaço para amor e estabilidade? Talvez tudo junto, mas nada é literal no filme, o que torna ainda mais interessante.
Sean Baker se inspirou, de forma explícita, em Cabíria, a protagonista de Noites de Cabíria (1957), de Federico Fellini. Tal como a prostituta ingênua e sonhadora interpretada por Giulietta Masina, Ani é uma figura que busca algo maior, seja amor, segurança ou um futuro promissor. Em entrevista ao site Indiewire, Baker revelou que a cena final de Anora foi diretamente influenciada pela obra de Fellini. Embora os desfechos sejam distintos, ambos compartilham a mesma emoção.
Além disso, o filme explora com sensibilidade a luta de classes, uma temática recorrente nos trabalhos de Baker. Ani, jovem pobre com poucas perspectivas, é confrontada com a realidade elitista e impiedosa da família de Vanya, um choque que ressalta sua vulnerabilidade diante do poder econômico e social.
Anora também se destaca por desafiar rótulos de gênero cinematográfico Enquanto a busca por Vanya gera situações absurdas e cômicas, o filme nunca perde de vista o drama existencial de sua protagonista. A mistura de humor, tensão e compaixão faz dele um filme impectante, onde o espectador se compadece e torce pela emancipação de Ani.
Com uma direção sensível e um elenco espetacular, Anora é uma obra indispensável. Mikey Madison, em particular, merece atenção especial por sua interpretação, consolidando-se como um dos grandes destaques da temporada.