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Espelho meu: busca pelo corpo perfeito entre os famosos é assustadora

O mês de novembro foi marcado pela morte precoce da influenciadora Luana Andrade, ex-participante do Power Couple Brasil, aos 29 anos. Segundo o Hospital, a causa da morte foi uma embolia pulmonar maciça. O empresário da assistente de palco revelou ao iG Gente que  ela estava internada para realização de uma cirurgia de lipoaspiração e sofreu quatro paradas cardíacas antes da morte.

A partida sem o direito de despedida pegou famosos, influenciadores e internautas desprevenidos, os deixando em estado de reflexão: qual o limite da busca pela perfeição? (E que perfeição seria essa?).

Se você segue alguma influenciadora com mais um milhão de seguidores nas redes sociais, provavelmente já deve ter visto algo relacionado a procedimentos estéticos como harmonização facial, lipoaspiração, preenchimento e implante de próteses, que, diariamente, surgem como opções no mercado da beleza.

A realidade aponta que o padrão estético está ficando cada vez mais estreito, cada vez mais impossível de ser atingido e mais excludente. Afinal, se todos são, ninguém é.

O avanço da tecnologia permite que detalhes sejam ajustados em pouco tempo. Essa dinâmica faz com que características naturais sejam taxadas como defeitos em menos tempo ainda. 

Definitivamente, o padrão estético imposto não abrange a diversidade de corpos. Esse padrão frequentemente ignora etnias e características físicas que existem na sociedade, promovendo um ideal único de beleza, excludente e potencialmente racista. 

“A imposição de novos padrões estéticos faz com que as pessoas comecem a observar problemas onde não existiam. É muito comum que os seguidores se sintam pressionados a ter esse mesmo padrão, se comparem e comecem a ter uma autoimagem negativa. Tal sensação é seguida por uma sensação de frustração, pois nem todos os seguidores têm o padrão social e condições financeiras para realizar os mesmos procedimentos”, avalia a psiquiatra Jessica Martani.

A questão dos procedimentos estéticos preocupa devido à banalização. Com a notoriedade dos influenciadores, clínicas passaram a promover os procedimentos por meio de parceria e permuta. E cada vez mais protocolos são ignorados em razão da pressa de pertencer a esse núcleo.

O Brasil é o segundo país que mais realiza procedimentos estéticos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, aponta o levantamento da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) referente a 2022.

Em relação a cirurgias estéticas, o Brasil ocupa a primeira posição. Além disso, o estudo indica que os procedimentos mais procurados foram lipoaspiração, aumento de mama, cirurgia de pálpebras, abdominoplastia e lifting mamário. 

Para a advogada Cátia Vita, especialista em direito da saúde, não há leis específicas para a responsabilização das influenciadoras e das clínicas que promovem propaganda desenfreada. Entretanto, essas entidades podem ser alvos de processos.

“Há alguns juízes que acabam condenando essas influenciadoras pelo exagero. Há influenciadores que falam que só se alimentam daquilo, que só têm esse tipo de tratamento, influenciando diretamente para aquela pessoa adquirir aquele produto específico. Então, devido o exagero, a forma que faz a propaganda, pode ser que o influenciador também seja responsabilizado”, explica a advogada.

A especialista também analisa que é proibido gerar falsas expectativas. As clínicas não podem, ou não poderiam, expôr propagandas prometendo algo que não vai ser cumprido em totalidade.

“Está proibido no Código de Defesa do Consumidor enganar o cliente, gerar uma falsa expectativa, aquela expectativa de que fazer tal procedimento, tais sessões vai melhorar ou vai alterar totalmente. O consumidor tem o direito de ter preservado todas as informações e elas têm que ser claras, objetivas e não podem gerar expectativa para o consumidor”, enfatiza.

O padrão de beleza e a busca incansável pela perfeição mostram outros problemas para além da mesa cirúrgica, como transtornos comportamentais e psicológicos. 

“Vivemos em uma sociedade na qual a magreza ou até mesmo o culto a aparência musculosa não é considerado um problema, então, é comum as pessoas fazerem de tudo para atingir esses padrões, mesmo não tendo genética para isso, é comum o uso de medicações sem prescrição médica e o uso de hormônios nos quais não haveria indicação. A obsessão por esses tipos de padrões corporais podem desencadear transtornos alimentares como anorexia, bulimia e também vigorexia”, explica a psiquiatra Jessica Martani.

O desprezo pela própria imagem é ainda mais incisivo no mundo dos famosos, onde o público sente-se no direito de sentar na cadeira de juiz, apontando cada possível falha, defeito ou característica natural.

O  influenciador Rico Melquíades vem viralizando nas redes sociais devido à quantidade de procedimentos estéticos que realiza.
Honesto, o campeão de “A Fazenda 13” revelou a baixa autoestima e lamentou receber milhares de mensagens o chamando de feio.

“Deixa eu desabafar com vocês, eu fiz esse procedimento de mudar porque eu não aguentava mais vocês me chamarem de feio no direct, e isso mexe muito comigo”, declarou, adicionando: “Eu fiz esses procedimentos para seguir o padrão que a sociedade pede, infelizmente”.

Em 2018, Bruna Marquezine surpreendeu ao expôr a batalha contra o espelho. Na época, a atriz foi alvo de diversos ataques a criticando pela “magreza”.

Anos antes, Marquezine enfrentara uma obsessão pelo corpo magro, chegando a tomar laxante diariamente por três meses para emagrecer. A causa do transtorno foi motivada por comentários apontando que a bochecha dela estava volumosa demais. 

Relatos como os de Bruna e Rico não são incomuns entre as celebridades. Permanecer em um ambiente competitivo em que a aparência física é material de trabalho, coloca mulheres, principalmente, em posição de subserviência. 

O estudo da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) indica que 85,7% dos procedimentos estéticos realizados no mundo em 2022 foram em pacientes do gênero feminino. 

“Quanto mais somos expostos a belezas padronizadas, maior fica a nossa lente, e essa lente acaba apontando por ‘defeitos’ que, na verdade, são nossas características genéticas, são nosso diferencial. Nessa lente nós comparamos mais, vemos problemas que não existem e detalhes aos quais não iriam fazer nenhuma diferença. Tudo isso aliado a uma cultura na qual a mulher deve ser um quadro de admiração faz com que as mulheres se sintam muito pressionadas, achando válido correr riscos de vida e achando que o custo benefício de se submeter a riscos para ser bela ‘vale a pena'”, reflete a psiquiatra Jessica Martani.

Não existe um segredo capaz de fazer com que se possa acordar todos os dias de bem com o espelho. Entender que o processo de autoimagem não é linear e constante é um bom começo. Há, sim, outras medidas que podem ser adotadas a fim de lidar com a realidade e o corpo real. Se cercar de influências reais é um dos passos.

“Acredito que para nos mantermos saudáveis emocionalmente é sempre importante ter autoconhecimento, realizando psicoterapia e com isso observar seus talentos e qualidades, entender que a aparência física não é definidora da sua autoestima. Existem muitos elementos que nos fazem nos sentir mais seguros e empoderados. É importante ter um autoconhecimento sobre nossa trajetoria e vitórias, é importante também reduzir a exposição a conteúdos que promovem padrões de beleza, bem como se voltar para o mundo real, contato com a natureza, compartilhar experiências com pessoas reais e com isso se fortalecer e perceber que ser belo é ser diferente, é ser único, é ser você”, aconselha a psiquiatra Jessica Martani.

+ O “AUÊ” é o programa de entretenimento do iG Gente. Com apresentação de Kadu Brandão e comentários da equipe de redação, o programa vai ao ar toda quarta-feira, às 12h, no YouTube, com retransmissão nas redes sociais do portal.

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