Há pouco mais de 300 anos, três pescadores lançaram suas redes no Rio Paraíba do Sul, no interior paulista, e trouxeram à tona uma pequena escultura de argila. O que parecia apenas mais um objeto perdido no leito do rio se tornaria, com o tempo, um dos maiores símbolos da fé católica no país: Nossa Senhora Aparecida, a Padroeira do Brasil.
Mas, ao longo desses séculos, uma pergunta persiste entre fiéis e estudiosos: por que a imagem da santa é negra?
Uma origem envolta em mistério
A falta de registros oficiais da época mantém abertas diversas hipóteses sobre o achado. O consenso entre historiadores é que a escultura representava originalmente Nossa Senhora da Conceição, devoção popular em Portugal e nas colônias, cuja imagem tradicionalmente é branca.
Segundo a historiadora Tereza Pasin, autora de “História de Nossa Senhora Aparecida”, a peça teria sido confeccionada por volta de 1650, em um mosteiro de Santana de Paranaíba (SP), feita com barro local — o chamado “barro paulista”. Décadas depois, já no início do século XVIII, ela teria sido lançada ao rio, possivelmente por estar danificada, e acabaria sendo resgatada pelos pescadores em 1717.
As velas que escureceram a imagem
Uma das explicações mais aceitas para a tonalidade escura é simples: o tempo e a devoção. A imagem ficava nos altares de fazendas e oratórios, cercada por velas. A fuligem, com o passar dos anos, pode ter escurecido a cor.
A historiadora destaca que a energia elétrica só chegou ao Brasil por volta de 1880, mais de um século após a imagem ter sido encontrada. Durante todo esse tempo, o uso de velas primitivas — que produziam fumaça densa — teria contribuído para o enegrecimento da escultura.
O efeito do tempo submersa
Outra hipótese considera o período em que a imagem permaneceu submersa no rio. Não se sabe ao certo quanto tempo ela ficou embaixo d’água, mas acredita-se que foram anos suficientes para alterar a pintura original.
Símbolo de fé e representatividade
Independentemente da causa, a cor da imagem foi prontamente acolhida pelo povo brasileiro — especialmente entre comunidades negras e quilombolas, que se viram representadas em sua figura.
Pasin reforça que Nossa Senhora Aparecida sempre foi reconhecida como uma imagem negra e que isso nunca foi motivo de questionamento entre os devotos.