De que forma o racismo e as barreiras à acessibilidade afetam as viagens de pessoas negras e com deficiência?
Esse foi o tema de uma das rodas de conversa desta quinta-feira (21) no Espaço da Diversidade do Salão do Turismo 2025, que vai até sábado (23) em São Paulo, no Distrito Anhembi.
“ Os impactos de gênero, raça e classe são muito, muito fortes também no turismo ”, disse a historiadora Melina de Lima, servidora do Ministério da Igualdade Racial ( MIR), neta da escritora Lélia Gonzalez e uma das convidadas da mesa.
Mediada pela Assessoria de Participação Social e Diversidade do Ministério do Turismo, a mesa também teve a presença de Solange Barbosa, proprietária de uma agência de turismo especializada em afroturismo, e da jornalista Jessica Paula, empresária e mulher com deficiência que foi a primeira paraplégica a escalar o Pão de Açúcar.
Com a mediadora Juliana Paiva, as três mulheres discutiram como o racismo, o machismo, a homofobia e a falta de acessibilidade em alguns roteiros afetam suas experiências turísticas.
Jessica Paula lembrou que acessibilidade não é, necessariamente, o mesmo que inclusão. Ela usou o exemplo hipotético de uma viagem com trilhas em que uma Pessoa com Deficiência na mobilidade faça o percurso de carro.
“ Se aquela trilha tem a experiência de abraçar uma árvore, pegar uma formiga no chão, não é inclusiva, porque eu não tô vivendo a mesma experiência dentro do carro ”, disse.
“ A inclusão é você viver a experiência o mais próximo possível do que a maioria das pessoas pode viver ”, completou a jornalista.
Já Melina e Solange, ambas mulheres negras, reforçaram que o racismo é algo que perpassa suas experiências de viagem – no caso de Melina, como turista, e, para Solange, enquanto empresária.
Melina contou que, quando viaja a destinos brasileiros, é frequente que as pessoas falem com ela em outras línguas que não o português, por pensarem que é estrangeira.
“ É inconcebível que uma mulher negra esteja turistando. Eles não conseguem enxergar que eu sou uma negra brasileira turistando ”, comentou.
Ela acrescentou que, sendo lésbica, também precisa avaliar se, em todos os lugares aonde vai com a esposa, ambas estarão seguras. “ Eu penso no machismo, no racismo e na homofobia quando vou viajar ”, disse a historiadora.
Necessidade de qualificação
Já a empresária Solange Barbosa destacou que é necessário qualificar o turismo para destinos de afroturismo.
Uma questão séria do setor é, por exemplo, o transporte. Solange contou que chegou a pagar 15% a mais a transportadoras de turismo para que levassem seus clientes a uma comunidade quilombola – pelo fato de os operadores acharem que estavam indo a um local perigoso.
“ Às vezes a empresa coloca o pior ônibus que ela tem [para levar as pessoas], então o turista já chega no quilombo com raiva ”, narrou.
Uma outra dificuldade do ramo, disse Solange, é fazer com que as pessoas não associem o afroturismo apenas a locais históricos relacionados à escravidão.
“ Tem esse fetiche de escravização e do sofrimento ”, afirmou. Como exemplo de uma possibilidade de local a ser visitado, ela mencionou os quilombos. “ Não existe lugar de tanta potência, de tanta resistência, de tanta possibilidade quanto uma comunidade quilombola ”, afirmou.
Bons exemplos
Jessica Paula também citou bons exemplos de acessibilidade em locais que visitou: a cidade de Socorro (SP). “É referência internacional em turismo acessível” , disse.
Já Belém, que vai sediar a COP-30 em novembro, também entrou para a lista de casos positivos, apesar de não seguir, exatamente, as especificidades técnias. “Sempre davam um jeitinho” , contou.
Fora do Brasil, tiveram destaque a Costa Rica, com praias acessíveis, e San Luís Potosí, no México.
A jornalista reforçou que o público com deficiência e a acessibilidade precisam ser vistos como um negócio. “ Eu quero consumir; eu quero viajar. É isso que a gente quer no final do dia ”, concluiu.
O Salão do Turismo é organizado pelo Ministério do Turismo em parceria com o Governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura Municipal de São Paulo.
A participação no salão é aberta ao público e gratuita, mediante inscrição.