Mas, ali, mesmo sob o domínio precário de um 4G, o tempo parecia andar diferente.
Julho chegou.
Para quem tem filhos em idade escolar, não é apenas o meio do ano. É uma mudança radical de rotina.
No meu caso, viemos para Florianópolis, onde minha filha pode passar parte do tempo com os avós maternos. Um respiro — logístico, afetivo, necessário. No fim de semana, aproveitamos para visitar a cidade de Praia Grande, em Santa Catarina.
E não se engane: a cidade não tem praia, nem é grande.
Mas abriga algo raro — uma chance real de desconexão.
Localizada na divisa com o Rio Grande do Sul, entre cânions monumentais e silêncios que parecem de outro tempo, Praia Grande virou a “Capadócia brasileira” pelos passeios de balão. Recentemente, um desses voos terminou em tragédia, o que colocou a cidade no noticiário.
Mas, ali, mesmo sob o domínio precário de um 4G, o tempo parecia andar diferente.
Confesso: me peguei imaginando como seria viver ali. Literalmente longe dos feeds, dos conteúdos, da lógica da produção constante.
Seria eu capaz de me reinventar completamente?
Ter uma horta. Começar um negócio local. Fazer algo que não envolvesse comunicação, pensamento crítico, inteligência artificial ou redes sociais?
Fica aqui o exercício:
Você conseguiria?
Você conseguiria começar do zero, sem carregar sua identidade digital como bagagem? Seria mais difícil ou mais fácil?
Ontem, segunda-feira, recebi por mensagem um vídeo do Keanu Reeves, contando que estava jantando na casa de um amigo. Entre os convidados, jovens de 13 a 17 anos. Nenhum deles havia assistido Matrix.
Keanu resumiu o filme e quando chegou na cena em que seu personagem escolhe sair da realidade simulada, tomar consciência da verdade — os jovens reagiram:
“Mas… por que ele quis isso?”
Para esse recorte da geração Z, escolher a realidade pior em nome da verdade não faz sentido. A ilusão, desde que confortável, parece ser suficiente. E eu fiquei com isso na cabeça.
Será que, aos poucos, estamos todos naturalizando a simulação?
Será que vamos perdendo o desejo de saber o que é real, desde que estejamos distraídos, alimentados, entretidos? Será que a vida na cidade nos coloca na Matrix?
Julho é mês de pausa.
Talvez também possa ser um bom mês para pensar:
Em que momento deixamos de querer saber a verdade sobre o mundo — e sobre nós mesmos?
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal iG